África em busca da afirmação

CHEFES DE ESTADOS E DE GOVERNO QUE PARTICIPARAM NA 30ª SESSÃO ORDINÁRIA DA CONFERÊNCIA DA UNIÃO AFRICANA (UA) FOTO: PEDRO PARENTE

CHEFES DE ESTADOS E DE GOVERNO QUE PARTICIPARAM NA 30ª SESSÃO ORDINÁRIA DA CONFERÊNCIA DA UNIÃO AFRICANA (UA)
FOTO: PEDRO PARENTE

Os líderes africanos marcaram na Etiópia, de 28 a 29 deste mês, mais um importante passo rumo à afirmação e independência económica do continente, durante a 30ª Sessão Ordinária da Conferência dos Chefes de Estado e de Governo da União Africana (UA).

Pressionados por problemas candentes que prejudicam a imagem de África no mundo, como a corrupção, imigração, fome, pobreza e os conflitos, afluíram em massa a Addis-Abeba, com mais de 40 Presidentes e Chefes de Governo, para falar uma só voz e materializar os anseios dos africanos.

A reunião de cúpula, da qual participou pela primeira vez o Presidente de Angola, João Lourenço, decorreu num cenário bastante adverso para o continente que assiste ao recrudescer de guerra e instabilidade em territórios já antes pacificados, como o Sudão do Sul.

Durante dois dias, os líderes africanos debruçaram-se em profundidade sobre os conflitos crónicos e sobre a questão de paz e segurança, tendo apontado caminhos que poderão ser trilhados, a partir do mandato de 2018, para a estabilidade social, política e militar tornar-se um facto.

Por altura dos trabalhos, apresentaram soluções para a situação da Líbia, da República Democrática do Congo (RDC), do Sudão do Sul e de outros Estados com problemas de instabilidade política, social ou humanitária, para os quais exigiram medidas mais concretas.

Os Chefes de Estado e de Governo comprometeram-se a sair da teoria à prática, trazendo soluções efectivas para esses Estados, pela via do diálogo, ou com operações de paz e segurança mais articuladas e independentes em termos de financiamento.

Por via e causa desses problemas políticos, África continua a ser um continente marginalizado.

Considerada uma das mais ricas regiões do Mundo, detém recursos naturais e força de trabalho abundante, mas, paradoxalmente, é um dos maiores palcos de tensão político-militar e crises humanitárias, com um pesado fardo de refugiados de guerra.

Um dos cenários mais alarmantes regista-se no Sudão do Sul, que tem um dos maiores índices de crescimento no mundo em termos de refugiados, segundo a ONU.

Dados dessa organização mundial apontam que o número de pessoas que deixou aquele país africano para buscar segurança em nações vizinhas já é de 1,6 milhão.

A nível interno, o Uganda é o país que mais acolhe refugiados sul-sudaneses. Pelo menos 800 mil já chegaram àquela Nação, 172 mil dos quais por via do Uganda, só em 2017.

Outros 572 mil deixaram o Sudão do Sul desde Julho de 2016.

O continente possui as maiores reservas minerais do mundo, sobretudo em termos de petróleo e gás. Entretanto, milhares de nativos continuam a viver abaixo da linha de extrema pobreza.

Em muitos dos 55 Estados membros da União Africana, a fome, a miséria, a falta de condições sanitárias e as mortes por má qualidade hospitalar continuam a ser marcas registadas que travam a marcha de um continente “mergulhado” em sonhos e ambições.

De acordo com o Relatório da Bienal da Declaração de Malabo, o Continente Africano “não está no bom caminho” no que se refere ao fim dos indicadores de fome.

De acordo com o Relatório de Estado da Insegurança Alimentar da ONU (2017), a África registou “progressos lentos” no sentido de alcançar indicadores de segurança alimentar e nutrição.

Essa situação, lê-se no relatório, “está intimamente associada ao aumento do conflito exacerbado por choques relacionados com o clima, seca e outros factores que ameaçam reduzir a produtividade agrícola e pecuária do Continente Africano”.

Estatísticas apontam que África tem hoje uma das maiores taxas de sero-prevalência, um índice cada vez mais crescente de terrorismo e inúmeras perdas com Fluxos Migratórios Ilícitos.

A luta pela afirmação do continente passa, em primeira instância, por comprometimento mais efectivo das suas lideranças e da menor dependência financeira do exterior.

Foi com esse sentimento e com um Programa de Reforma para fazer da União Africana um órgão mais respeitado no Mundo, que os Chefes de Estado e de Governo buscaram convergir estratégias e soluções exequíveis, para tirar o continente da “pobreza”.

Os líderes africanos uniram forças para ajudar a acabar com o problema da imigração, corrupção e da fome, bem como procuraram rápidas soluções e melhorias para o plano comum de paz e segurança.

Sobre a mesa de trabalhos estiveram relatórios importantes, como o Plano de Reforma Institucional, um dos mais discutidos instrumentos, que reacende o sonho de uma África mais unida, combativa e menos dependente dos financiadores estrangeiros.

Com o Programa de Reformas, liderado pelo Presidente do Ruanda Paul Kagame, que assumiu nessa Cimeira a liderança da UA, África espera por resultados práticos e inovadores no seu processo de auto independência e afirmação no mundo.

O instrumento vai permitir aos Estados membros da organização continental uma contribuição mais sustentada, com uma taxa de 0,2 sobre as importações elegíveis.

Na Cimeira, a questão da reforma institucional da organização “dividiu” os Estados membros. Apesar dos progressos, o impasse deve ser resolvido por altura da reunião de Cúpula de Julho, na Mauritânia.

A esse respeito, alguns países, nomeadamente a África do Sul e o Egipto, levantaram algumas questões relativamente ao auto-financiamento da organização.

O programa vai permitir à União Africana redimensionar os seus programas e financiar os seus Planos de Paz e Segurança, sem ficar refém de interesses e chantagens externas.

Livre circulação

No domínio económico, os Chefes de Estado e de Governo da UA marcaram passos importantes, com a aprovação de dois relatórios estratégicos, que podem abrir novos ventos na integração continental e melhor circulação de mercadorias e bens.

O primeiro é o Relatório sobre a Zona de Livre Comércio em África, que se considera um passo fundamental para “incrementar o comércio inter-africano”.

A ser materializado, esse programa vai facilitar a circulação de pessoas e bens, valorizar  os produtores africanos e leva-los para vários países do Mundo a custos mais baixos.

Outra medida adoptada pelas lideranças africanas, que pode impulsionar o comércio e relançar os produtos de África, foi a aprovação do Relatório sobre o Mercado Comum da Aviação em África.

O seu propósito é facilitar a livre circulação no continente.

Prevê-se que a implementação desse instrumento permita aos africanos ter melhor ambiente de negócio e facilidades para potenciar o turismo, fazendo crescer a economia dos Estados.

A Proposta da criação do Mercado Único Aéreo mereceu luz verde de 23 países membros que aplaudiram o lançamento da iniciativa. A mesma visa, entre outros objectivos, melhorar a competitividade das companhias aéreas do Continente Africano.

Combate ao VIH

A 30ª Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo ficou marcada também pela realização de vários encontros paralelos, entre os quais o da  Organização das Primeiras Damas Africanas contra o VIH / SIDA (OAFLA), que lançou, em parceria com a UA, uma nova campanha contra o VIH/SIDA.

O plano, lançado durante a Assembleia Geral da OAFLA, designa-se “Free To Shine” e prevê ajudar a acabar com a SIDA em África até 2030 e manter as mães saudáveis.

A campanha unirá pessoas e organizações a nível local e mundial para promover a prestação de cuidados de saúde que contribuam para acabar com o VIH na infância.

Para alcançar o objectivo, a campanha dará enfoque a metas globais de 2020 para a eliminação da transmissão da mãe para a criança, conforme prevê o Quadro Catalisador da União Africana para acabar com o VIH, tuberculose e eliminar a malária em África até 2030.

Segundo dados, existem cerca de 1,4 milhão de crianças a viver com VIH, só na África ao Sul do Sahara. Isso representa mais de metade das crianças com o vírus no Mundo.

As crianças estão em maior risco de ter consequências potencialmente fatais do VIH do que qualquer outra faixa etária. Apesar disso, os níveis de detecção e tratamento permanecem baixos.

Do número total de crianças vivendo com VIH, cerca de 50 porcento não recebe tratamento e dessas 50 porcento morre antes dos dois anos de idade.

Angola fez-se representar na Assembleia Geral da Organização das Primeiras Damas Africanas contra o VIH, pela Primeira-Dama, Ana Dias Lourenço.

Combate à fome

Em paralelo à Cimeira, os líderes africanos fizeram um apelo urgente para a necessidade de concertar acções que possam erradicar a fome no continente até 2025.

O apelo à acção foi feito durante o Fórum de Alto Nível sob o tema “Parceria renovada para acabar com a fome na África até 2025″, organizado pela Comissão da União Africana, em parceria com o Governo da República Democrática Federal da Etiópia.

O fórum apresentou os resultados dos progressos realizados na Implementação da Declaração da UA Malabo, com particular ênfase no compromisso 3: Acabar com a Fome em África até 2025.

Identificou áreas de sucesso e áreas específicas que precisam de ser fortalecidas, tanto a nível nacional, quanto regional, para impulsionar acções para a Agenda de Desenvolvimento Sustentável de 2030, particularmente na erradicação da fome.

Os participantes concordaram em renovar o compromisso de acabar com a fome em África, até 2025, por via de investimento em agricultura sustentável, além de estabelecer programas de protecção social.

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